Cinema Orly, por Luís Capucho – Resenha sobre desejo, marginalidade e liberdade.
- Pedro Sucupira
- 28 de mai.
- 3 min de leitura
Atualizado: 29 de mai.
“Cinema Orly é um depoimento importante sobre uma das principais características da sexualidade, homossexual ou não: o sexo eventual sem compromisso, a poligamia, uma certa promiscuidade.”

Assim começa o prefácio escrito por João Carlos Rodrigues, que já nos prepara para o mergulho visceral, cru e profundamente humano proposto por Luís Capucho. Publicado pela primeira — e até hoje única — vez em 1999, Cinema Orly não é apenas um livro sobre sexo, muito menos apenas sobre homossexualidade. É um testemunho radical sobre o corpo, a cidade, a marginalidade e os afetos possíveis em uma sociedade que reprime, normatiza e moraliza quase tudo.
Luís Capucho, músico, escritor, bicha, sobrevivente, transforma em literatura suas memórias de frequentador do Cinema Orly, um espaço real, localizado no subsolo da Cinelândia, no Rio de Janeiro. Lá, entre escuridões e encontros, se encontravam aqueles que estavam à margem, os corpos desejantes rejeitados pela moral hegemônica. Na década de 1990, o Orly era tanto abrigo quanto palco: da sexualidade clandestina, da solidão partilhada, do desejo como forma de existir.
Mas engana-se quem pensa que o livro se resume à exploração do sexo casual. Cinema Orly é um gesto literário corajoso que transcende a promiscuidade e nos confronta com as entranhas da existência. Luís Capucho nos entrega um diário sem filtro, um mosaico de cenas, pensamentos e sensações que ora beiram a poesia, ora se tornam pura filosofia do cotidiano. Há dor, há gozo, há infância, doença, música, loucura e lucidez. Há, sobretudo, uma liberdade desconcertante.
Trata-se de uma obra despudorada, sim, e isso é uma virtude. Luís escreve como quem não deve nada a ninguém. Sua voz é livre de amarras morais, de estratégias de convencimento ou de busca por aceitação. Cinema Orly é literatura queer em sua forma mais bruta e autêntica. Não busca limpar a imagem da homossexualidade para caber nos moldes do respeito burguês. Ele escreve para quem vive à margem, para quem já foi deixado de lado, para quem não precisa de permissão para existir.
É compreensível que parte do movimento LGBTQIA+ mais normativo se incomode com o livro, como alerta o próprio prefácio, pois ele destoa da agenda da respeitabilidade. Ao invés de pautar apenas os direitos civis e a boa convivência, Capucho nos provoca a pensar sobre os corpos que não cabem, os desejos que não se domesticam, os amores que não seguem roteiro. E faz isso com uma voz sincera, muitas vezes melancólica, sempre pulsante.
Para além do sexo, Cinema Orly também nos oferece vislumbres de ternura, fragmentos de poesia, comentários existenciais. Entre uma transa e outra, surgem reflexões sobre a morte, a solidão, a liberdade, a doença, o amor, a música e o cotidiano. Luís mistura filosofia e travessia. Ele nos mostra que mesmo o que há de mais sujo, de mais rejeitado, pode conter beleza, lucidez e dignidade.
Ler Cinema Orly é um ato político. É também um gesto de amor pelos que vieram antes de nós e pelos que ainda não nasceram. É reconhecer que nossas histórias importam, mesmo as que não cabem nos livros escolares ou nos discursos de palanque.
Se você tem interesse em ler essa obra tão potente e (infelizmente) ainda pouco difundida, eu tenho o PDF. Basta se inscrever no meu blog e entrar em contato comigo, terei prazer em compartilhar. Cinema Orly é um livro que precisa circular. Que precisa ser lido. Que precisa ser lembrado.
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Se você chegou até aqui, muito obrigado pela companhia. Meu nome é Pedro Sucupira, sou professor, pesquisador em formação e um curioso incansável. Amo estudar, ler e, recentemente, descobri o prazer inescapável da escrita. Sou um explorador apaixonado por literatura, comportamento humano, sociedade e por tudo que toca os campos da ciência e da saúde.
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